Vocabulário usado em círculos NHINCQ+ inclusivos

Aviso de conteúdo: Por ser um texto explicativo, esta postagem conterá exemplos de retórica anti-NHINCQ+ (e ocasionalmente opressiva contra outros grupos também) em diversos aspectos, além de menções a termos obsoletos/inadequados.


Muitas vezes, espaços NHINCQ+ só consideram vocabulário básico saber o que significam certas orientações, identidades de gênero, modalidades de gênero, corporalidades e nomes de opressões específicas para certos grupos (como homomisia [“homofobia”] ou transmisia [“transfobia”]).

Podem até mesmo não explicar tais conceitos direito, em nome de “deixar as coisas mais fáceis” (ainda que isso deixe as coisas mais difíceis por conta de ser difícil combater a desinformação).

Em espaços mais inclusivos, queremos não só considerar que grupos específicos são ou passam por certas coisas. Ou que só os termos da sigla LGBTQIAPN+ merecem atenção. Existem infinitos rótulos possíveis para orientações e identidades de gênero, e não queremos ignorar que, por exemplo, a falta de reconhecimento de pessoas que sentem atração por mais de um gênero afeta mais do que pessoas bi. Afinal, existem pessoas pan, tóren, tríxen, pôli, ômni, urânicas, netúnicas, penúlti

No entanto, antes de começar as listas, quero pontuar que estes termos mais abrangentes são simplesmente mais adequados em muitas situações, mas não necessariamente eliminam a utilidade ou necessidade de termos já existentes. Por exemplo, se alguém fala de como especificamente a orientação bi é retrógrada e desnecessária, e que pessoas deveriam usar pôli, pan ou outras identidades múlti, a pessoa está sendo bimísica, afinal, isso realmente só afeta pessoas bi.

Termos juvélicos

Termos juvélicos podem ser descritos resumidamente como aqueles definidos por [alguma identidade] que sente atração por [um ou mais grupos].

Podem ser usados como orientações (“não me chame de gay e nem de bi, eu sou só aquileano”), ou como grupos que pessoas se encaixam mesmo que não os usem como orientações (“eu, que sou ceteroflexível, quero falar com minhe amigue pan para fazermos um grupo enebeano”).

Como já falei em outra postagem sobre isso, existem dezenas de termos juvélicos, e não acho que há a necessidade de decorar todos. Porém, acho que pode ser útil saber ao menos o que são os seguintes termos, já que eles são usados em mais discussões:

Uma pessoa aquileana é homem e sente atração por homens, exclusivamente ou não. Pessoas não-binárias que se identificam mais ou menos com esta descrição também podem usar o termo. Este termo é útil para agrupar questões de homens que gostam de homens, não importando se são pan, toren, gays, etc.

Uma pessoa diamórica é não-binária, e quer enfatizar isto independentemente dos gêneros por quais sente atração. Por exemplo, uma pessoa pode dizer que seu amor por mulheres é diamórico por não estar vindo de uma mulher e nem de um homem (ou seja, não é uma atração sáfica ou duárica).

Falar sobre questões diamóricas é falar sobre as questões de atração pelas quais pessoas não-binárias passam, como as deste tópico aqui; a utilidade do termo é a de falar sobre a não-duaricidade da atração de pessoas não-binárias não importa por quem tal atração seja.

Uma pessoa duárica ou é homem e tem atração (exclusiva ou não) por mulheres, ou é mulher e tem atração (exclusiva ou não) por homens. Este termo é útil para falar sobre pessoas em relacionamentos homem + mulher que não necessariamente são hétero. Também é o termo que dá o nome para duaricismo, um termo que será definido em outra lista.

Uma pessoa enebeana é uma pessoa não-binária que sente atração por pessoas não-binárias, exclusivamente ou não. Este termo é útil para agrupar questões de pessoas não-binárias que gostam de pessoas não-binárias, não importando se são poli, trixen, cétero/medisso, etc.

Uma pessoa sáfica é mulher e sente atração por mulheres, exclusivamente ou não. Pessoas não-binárias que se identificam mais ou menos com esta descrição também podem usar o termo. Este termo é útil para agrupar questões de mulheres que gostam de mulheres, não importando se são lésbicas, bi, omni, etc.

Existem outros termos juvélicos que também acho que são bem úteis, como os outros citados aqui, mas eles não são tão conhecidos.

Termos que abrangem várias orientações

Estes termos também podem ser usados como orientações por si só, mas geralmente são apenas usados para incluir pessoas de múltiplas identidades que se encaixam em certa descrição.

Orientações a-espectrais são as definidas por ausência total ou parcial de atração, ou que ao menos demonstram uma relação complicada com um ou mais tipos de atração. Este termo inclui pessoas que, em ao menos um tipo de orientação (sexual, romântica, queerplatônica, etc.) que consideram relevante:

  • Não sentem atração alguma (tais pessoas podem se identificar como arromânticas, assexuais, omniassexuais, omniarromânticas, cúpio, etc.);
  • Só conseguem sentir atração por pessoas que não são próximas e/ou que não existem (tais pessoas podem se identificar como fray, akoi/lith, procul, ficto, etc.);
  • Só sentiram atração por uma ou por poucas pessoas em sua vida inteira (tais pessoas podem se identificar como uni, gris/gray-a, auto, oligo, etc.);
  • Só sentem atração por pessoas que preenchem condições específicas e pouco comuns (tais pessoas podem se identificar como âmicus, demi, etc.);
  • Não entendem e/ou não se importam com a atração que sentem, e talvez nem tenham certeza se sentem atração ou não (tais pessoas podem se identificar como cas, quoi, etc.);
  • Sentem atração, frequentemente ou não, mas tal atração é fraca ou vaga (tais pessoas podem se identificar como gris/gray-a, caligo, etc.);
  • Possuem uma orientação que ocasionalmente muda para um ou mais dos funcionamentos de atração listados aqui (tais pessoas podem se identificar como acefluidas, acefluxo, arofluxo, alternafluxo, adfectu, aropulso, disfo, etc.);
  • Talvez não se encaixem nas categorias descritas, mas em algum grau não sentem atração forte, frequente e/ou duradoura, ou são pessoas cuja atração acaba sendo irrelevante a ponto da pessoa ter experiências similares a pessoas que não sentem atração forte, frequente e/ou duradoura.

Ao contrário de termos como espectro assexual, a-espectral abrange mais tipos de atração. Ao contrário de termos como espectro cinza, a-espectral também cobre quem não sente atração alguma.

Orientações flexíveis são as que são definidas como “atração frequente por [gênero ou gêneros], mas atração pode acontecer ocasionalmente por [gênero ou gêneros]”. Geralmente, tais orientações possuem flexível no fim; virflexível, heteroflexível, noninflexível, etc. Qualquer orientação flexível também é múlti.

Orientações fluidas são as que pessoas usam quando o modo de sua atração funcionar muda de tempos em tempos. Este termo abrange pessoas abro, aero, duo, merc, arofluxo, acefluxo e acefluidas, entre outras.

Orientações indefinidas são as de pessoas que não podem ou querem definir como exatamente sua orientação funciona, ao menos para outras pessoas. Este termo abrange pessoas pomo, novi e com, entre outras.

Orientações múlti são as de pessoas que sentem atração por mais de um gênero. Uma lista parcial de orientações multi pode ser encontrada aqui.

Modalidades de gênero

Todos estes termos podem ser usados apenas como seus prefixos (cis, ipso, utrinque, etc.), ou com o sufixo gênero no fim (cisgênero, ipsogênero, utrinquegênero, etc).

Algumas pessoas tratam estas palavras como palavras com final de palavra flexível (pessoa transgênera, menine transgênere), e outras não (pessoa transgênero, menine transgênero). Não há padrão, então a escolha é sua.

Cis: Alguém que se identifica totalmente e constantemente com o gênero que lhe foi designado ao nascimento, e que a sociedade eurocêntrica trata como experiência padrão de ser “homem de verdade” ou “mulher de verdade”.

Ipso: Alguém intersexo que se identifica totalmente e constantemente com o gênero que lhe foi designado ao nascimento. O quanto de experiências que pessoas ipso podem ter em comum com pessoas trans vai variar de pessoa para pessoa ipso, mas, de qualquer forma, corpos ipso não são contemplados pelo padrão cis do que é “natural”/”ideal”.

Iso: Alguém que não se vê como cis ou trans. Como existem outras modalidades de gênero além destas, é difícil saber se é para ser um termo guarda-chuva para essas outras modalidades, ou se é apenas para quem não se encaixa ou não se vê como outras modalidades de gênero.

Trans: Alguém que não se identifica com seu gênero designado ao nascimento, ou que mesmo que se identifique com ele em algum nível, tal identificação não é constante ou completa.

Últer: Alguém intersexo que não se identifica com seu gênero designado ao nascimento, ou que mesmo que se identifique com ele em algum nível, tal identificação não é constante ou completa. Porém, tal pessoa não se sente confortável em se ver como trans por ser intersexo.

Utrinque: Alguém que, mesmo se identificando com seu gênero designado totalmente e completamente, tem um corpo que passou por algum tipo de transição e que por isso tem experiências mais parecidas com as de pessoas trans do que de pessoas cis. Termo exclusivo para pessoas em sistemas onde outras pessoas/as pessoas principais são trans e decidiram viver como tal, ou para pessoas intersexo cujos corpos estão bem distantes do esperado para uma pessoa cis.

Identidades de gênero importantes

Assim como acontece com termos juvélicos, existem muitos termos para identidades de gênero, e você não precisa saber todos. Porém, em discussões, ou mesmo em definições, pode haver a presunção de que as pessoas que estão lendo já conhecem termos como estes:

Agênero: Geralmente se refere a alguém sem gênero, mas ocasionalmente pode se referir a alguém com um gênero neutro ou que se recusa a rotular seu gênero.

  • Espectro agênero: Um termo para identidades de gênero relacionadas com ausência de gênero, rejeição de gênero, gêneros fracos e gêneros neutros.

Aporagênero: Um gênero que não é homem ou mulher, ou qualquer coisa entre estes, mas que é um gênero forte com uma experiência distinta e específica. Este termo ocasionalmente é usado como guarda-chuva para gêneros como maverique e ilyagênero.

Bigênero: Alguém que tem dois gêneros.

Demigênero: Alguém que é parcialmente de um gênero.

Enebê: Uma forma resumida de se referir a pessoas não-binárias, a qual pode ser usada como substantivo (por exemplo: elu é ume enebê, nós enebês precisamos nos unir). Vem da abreviação NB.

Fingênero/feegênero: Um termo guarda-chuva para gêneros femininos. Em questão de identidades não-binárias, um gênero feminino é um gênero que tem a ver com feminilidade, e que não precisa ter nada a ver com o gênero mulher. Alguns exemplos de fingêneros são nonera, melle e femigênero.

Gênero-fluido: Alguém cujo gênero muda de tempos em tempos.

Gênero-fluxo: Um gênero que muda de intensidade de tempos em tempos.

Gênero neutro: Um gênero relacionado com neutralidade, ou que está “entre” todos os gêneros. Há alguns outros usos do termo também.

Intergênero: Alguém cuja identidade de gênero é definida ou influenciada por sua intersexualidade.

Mingênero/meegênero: Um termo guarda-chuva para gêneros masculinos. Em questão de identidades não-binárias, um gênero masculino é um gênero que tem a ver com masculinidade, e que não precisa ter nada a ver com o gênero homem. Alguns exemplos de mingêneros são nonvir, femil e mascugênero.

Não-binárie: Alguém que não é 100% homem ou 100% mulher. Existem várias formas de ser não-binárie, como ter um gênero relacionado a homem que não é o gênero homem binário, ter um gênero entre homem e mulher, não ter gênero, ter um gênero totalmente diferente de homem e de mulher, ter vários gêneros ao mesmo tempo, ter vários gêneros mas um de cada vez, entre outras possibilidades. Leia mais aqui.

(Nota: Não-binárie é a forma que usa o final de palavra e, de um termo que possui final de palavra flexível. Se diz “bandeira não-binária” e “orgulho não-binário”, e não “bandeira não-binárie” ou “orgulho não-binárie”, por exemplo.)

Neurogênero: Alguém cuja identidade de gênero é definida ou influenciada por sua neurodivergência.

Ningênero/neegênero: Um termo guarda-chuva para gêneros neutros. Alguns exemplos de ningêneros são gênero-esmeralda, fessari e neuvir.

Poligênero: Um termo para pessoas que possuem múltiplos gêneros. Algumas pessoas usam como um termo guarda-chuva para qualquer pessoa com mais de um gênero, enquanto outras consideram que pessoas bigênero (com dois gêneros) ou trigênero (com três gêneros) não possam se considerar poligênero.

Transfeminine: Alguém que foi designade como homem ao nascimento e que é trans/últer, e que se identifica como feminine e/ou como mulher em ao menos algum aspecto de sua identidade ou transição. Este termo é meio que um guarda-chuva para pessoas que possuem certa semelhança em experiência com mulheres trans binárias (e também inclui mulheres trans binárias).

Transmasculine: Alguém que foi designade como mulher ao nascimento e que é trans/últer, e que se identifica como masculine e/ou como homem em ao menos algum aspecto de sua identidade ou transição. Este termo é meio que um guarda-chuva para pessoas que possuem certa semelhança em experiência com homens trans binários (e também inclui homens trans binários).

Transneutre: Alguém que é trans/ulter, e que se identifica como neutre e/ou como gênero neutro em ao menos algum aspecto de sua identidade ou transição. Este termo é meio que um guarda-chuva para pessoas que possuem certa semelhança em experiência com pessoas gênero neutro (e também inclui pessoas gênero neutro).

Existem outros termos similares, como transandrógine e transxenine, mas não são termos tão utilizados.

Xenogênero: Alguém cuja identidade de gênero tem base em conceitos geralmente não associados ao mesmo espectro de gênero de gêneros binários. Ou seja, pessoas que acreditam que sua identidade de gênero só pode ser descrita (ou é melhor descrita) utilizando elementos da natureza, sentimentos, estéticas, sensações, objetos e conceitos, entre outras coisas, como metáforas. Detalhes aqui.

Termos para discriminação

Cissexismo é a crença de que a modalidade de gênero cis é superior, mais normal, padrão, natural, etc. Cissexismo prejudica pessoas cuja identidade de gênero é parcialmente ou totalmente diferente da designada, e também pessoas cujos corpos são tratados/percebidos como cisdissidentes mesmo que tais pessoas se encaixem em seu gênero designado (como pessoas ipso e utrinque).

  • Exorsexismo afeta especificamente pessoas cuja identidade de gênero sai parcialmente ou totalmente do binário 100% homem ou 100% mulher. Binarismo é um termo vago que pode ser usado em outros contextos, mas exorsexismo é especificamente para esta questão.
    • Monogenerismo se refere à ideia de que qualquer pessoa tem um gênero, o que exclui pessoas no espectro agênero e/ou que possuem mais de um gênero.
    • Reducionismo de gênero se refere à prática exorsexista de reduzir pessoas não-binárias a “basicamente homem” ou “basicamente mulher”, por mais que possam respeitar superficialmente a existência de pessoas não-binárias.

Conformismo de gênero e imposição de normas de gênero são termos usados para descrever opressão e discriminação contra quem sai dos papéis de gênero propostos para homens e mulheres. É algo que se entrelaça bastante com cissexismo e exorsexismo, mas não necessariamente de formas parecidas contra cada pessoa cisdissidente. Além disso, pessoas cis também sofrem com conformismo de gênero, tanto por conta de expressões de gênero fora do padrão quanto por heterodissidência.

Diadismo ou perissexismo é a crença de que as duas corporalidades perissexo (não-intersexo) padrão sejam superiores, normais, padrão, etc.

Exilinguismo ou exorlinguismo geralmente se referem a ódio e/ou rejeição do uso de neolinguagem. Como um dos objetivos da neolinguagem é dar uma liberdade de expressão maior para pessoas não-binárias, é algo muito ligado a exorsexismo, embora tenha a ver com imposição de normas de gênero e misoginia também.

Por conta das raízes das palavras, é possível que exilinguismo se refira a querer ficar dentro da língua padrão (ou seja, o conjunto -/-/- é aceito por quem é exilinguista). Exorlinguismo cobre rejeição e repulsa contra qualquer conjunto diferente de a/ela/a e de o/ele/o.

Heterossexismo é a crença de que a orientação que só pode ser descrita como hétero (sem nada adicional, ou seja, pessoas heteroflexíveis ou heterossexuais arromânticas não contam) é a orientação padrão, superior, modelo, natural, etc., ao detrimento de outras. Assim, heterossexismo pode ser uma palavra usada para falar da opressão e da discriminação sofrida por qualquer pessoa que saia deste padrão.

Heterossexismo pode também se manifestar de formas que prejudicam somente parte das pessoas heterodissidentes:

  • Alossexismo é a crença de que ser alo (ou seja, de que não ser a-espectral) é mais normal, melhor, etc. Alguém que presume que todo mundo sente atração sexual imediata por algum gênero que seja está sendo alossexista; isso afeta pessoas assexuais, demissexuais, etc., enquanto pode não afetar tanto pessoas pansexuais ou gays que sejam alo.
    • Amatonormatividade é a crença de que cada pessoa vai eventualmente achar o amor de sua vida, e que este deve ser o objetivo de vida de todo mundo. Estou colocando ela nesta posição pelo quanto afeta pessoas arromânticas e deste respectivo espectro, mas isso também afeta uma série de outros grupos, como pessoas não-monogâmicas e mulheres.
  • Duaricismo é a crença de que atração duárica e/ou de que relacionamentos duáricos são superiores, mais normais, mais naturais, etc. Uma pessoa dizendo que relacionamentos verdadeiros só podem existir entre um homem e uma mulher afeta pessoas que sentem atração que não é duárica, enquanto pode não afetar tanto uma pessoa assexual heterorromântica.
  • Monossexismo é a crença de que ter atração por um gênero só é mais normal, melhor, etc. Alguém que acha que sue parceire numa relação monogâmica vai lhe trair por “sentir falta de outros gêneros” só por sentir atração por mais de um gênero afeta pessoas múlti, mesmo que não afete pessoas que só sentem atração por um gênero.
    • Alossexismo também pode ser colocado dentro do monossexismo, porque esta atração por um gênero geralmente é presumida como frequente, forte e duradoura, ou acaba sendo classificada como inválida. Mesmo para uma pessoa binária, “você é gay/lésbica ou hétero?” também não é uma pergunta que inclui pessoas a-espectrais, mesmo que atração apenas por certo gênero seja parte de sua orientação.
    • Periorientismo é a ideia de que todas as pessoas são periorientadas, ou que ser periorientade é melhor/mais normal. Nenhuma pessoa variorientada se encaixa totalmente em um padrão de uma orientação mono, então pode-se dizer que periorientismo está dentro do monossexismo.
      (Os termos periorientade e variorientade são definidos mais abaixo.)

Queermisia é um termo que pode ser usado para discriminação contra:

  • Toda pessoa que está sendo considerada fora dos padrões di/cis/heteronormativos;
  • Grupos específicos fora dos padrões di/cis/heteronormativos;
  • Pessoas que se identificam como queer.

Reducionismo identitário ou exclusicionismo são termos usados quando se fala sobre a exclusão de parte das identidades NHINCQ+ que deveriam estar inclusas em algo, de forma consciente ou não.

Por exemplo, dizer que sofrer violência verbal ou física na rua por estar de mão dada com ume parceire é um problema exclusivo de homens gays está excluindo uma série de pessoas NHINCQ+ que podem ter esta experiência.

Alguns termos que não existem ainda, mas que já foram discutidos como forças existentes, são:

  • A ideia de que todas as pessoas não-binárias são basicamente de uma identidade só separada de gêneros binários, como se não houvesse diferença entre maveriques e neutrois e pessoas agênero, e como se juxeras, homens NB, demimulheres, homens-fluxo, ambonecs e etc. não pudessem ter identidades não-binárias relacionadas a gêneros binários.
  • A ideia de que ter uma orientação que nunca muda é normal/padrão/natural, e de que orientações fluidas não existem/são vergonhosas e deveriam ser escondidas/etc.

Outros termos terminados em -misia/-antagonismo/-intolerância/outros substitutos para “-fobia” (acemisia, panmisia, lesbimisia, etc.) são úteis! Porém, sua utilidade geralmente tem a ver com serem termos bem específicos para falar de ódio/discriminação contra certos grupos. Ou seja, eles não deveriam estar sendo usados para falar de coisas que também afetam outros grupos.

Outras coisas

Alinhamento de gênero é um aspecto que pode existir na experiência de gênero de uma pessoa parcialmente ou totalmente fora do binário de gênero. Serve para falar das similaridades entre tal pessoa e algum gênero, sendo que tais similaridades podem ser da aparência, políticas, de alguma parte da identidade não expressada pelos rótulos de identidade de gênero que a pessoa usa, ou pode até mesmo ser inexplicável.

Por exemplo, uma pessoa pode só se identificar como não-binária, mas sentir que tem mais em comum com homens do que com mulheres, e então dizer que seu alinhamento de gênero é homem. Enquanto outra pessoa pode ser agênero e não se identificar com gêneros binários em nenhum grau, mas considerar que a luta por direitos de mulheres que lhe afetam diretamente é uma parte essencial de sua identidade, e assim ter mulher como seu alinhamento de gênero.

Leia mais aqui, aqui, aqui e aqui.

Altersexo é um termo que pode ser usado para descrever:

  • Personagens cujas corporalidades seriam consideradas intersexo caso existissem no mundo real, mas que não são tratadas como tal no mundo fictício em que vivem;
  • Pessoas perissexo cujos corpos foram modificados de forma que não se encaixam em padrões perissexo (como pessoas trans que passaram por terapia hormonal);
  • Pessoas de qualquer corporalidade que desejam ter corpos fora das normas perissexo, sejam corpos possíveis naturalmente para humanes ou não. Estas pessoas podem se dizer angenitais quando não querem ter genitália, salmacianas ou bigenitais quando querem ter pênis e vagina, usar outros termos, ou não usar nenhum termo além de altersexo.

Expressão de gênero tem a ver com o que alguém quer expressar sobre sua identidade no dia-a-dia, por meio de roupas, entonação de voz, postura, forma de se arrumar, etc. A expressão de gênero pode ou não ter a ver com a identidade de gênero da pessoa.

Assim como identidade de gênero, expressão de gênero não pode ser corretamente presumida em vários casos, e não se limita a expressões binárias.

Em relação a gêneros binários, use de preferência apenas mulher e homem, e não feminino e masculino. Existem muitas pessoas cujos gêneros são femininos ou masculinos sem serem relacionados com ser mulher ou com ser homem.

A orientação hétero não deve ser definida de forma que “inclui” identidades não-binárias. A única orientação reconhecida como hétero é a definida por atração exclusiva de homens (binários) por mulheres (binárias), ou de mulheres (binárias) por homens (binários).

Definir hétero como “atração por gêneros diferentes” ignora que pessoas não-binárias não são previstas ou aceitas pela heteronorma. O relacionamento de uma pessoa gênero neutro com ume andrógine não é duárico só por não ser atração pelo mesmo gênero.

O termo “heterossexualidade compulsória é frequentemente usado por FREPTs (Feministas Radicais Exterminatórias de Pessoas Trans) para apoiar a ideia de que mulheres (cis) progressivas o suficiente vão ser sempre lésbicas (cis que só sentem atração por outras lésbicas cis), enquanto mulheres (cis) hétero ou múlti e uma série de outras populações são apenas vítimas do patriarcado que não sabem o que é bom para elas.

Existe sim pressão para que qualquer pessoa heterodissidente (o que inclui pessoas sáficas, aquileanas, a-espectrais, múlti, fluidas, etc. de qualquer gênero, mesmo que sejam trans) se encaixe ou na identidade hétero ou em moldes heteronormativos. Porém, caso sua intenção não seja a de invocar retórica monossexista e cissexista, sugiro usar heterossexismo, heteronormatividade, heteronormatividade coerciva, duaricismo, etc. em sua fala/seu texto/seu material.

Evite usar homo, homossexual, homossexual feminine/masculine, homorromântique, e afins para pessoas que não se identificam explicitamente como tal. Em geral, palavras como gay ou lésbica podem ser utilizadas, mesmo em relação a orientações puramente sexuais ou românticas.

Identidade de gênero pode ser, muitas vezes, um termo mais inclusivo do que gênero, porque identidades como casgênero (alguém que não se importa com a própria identidade de gênero), sem gênero (alguém que não tem gênero), gênero-fluido (alguém cujo gênero muda de tempos em tempos) ou poligênero (alguém que tem vários gêneros) não são gêneros por si só da mesma forma que maverique, ginx e homem são.

Mesmo assim, ainda não é recomendado que se diga que qualquer pessoa “se identifica como” alguma coisa ao invés de dizer que a pessoa é tal coisa. Ou seja, evite dizer “Fulane se identifica como pessoa não-binária” ao invés de dizer “Fulane é não-binárie” ou “Fulane é uma pessoa não-binária”.

Por favor, não use só LGBT. Caso você não se sinta segure em usar NHINCQ+ ou queer, tente LGBTQIAPN+, LGBTQIAP+ ou mesmo LGBTIA+. O + é importante para saber que você está incluindo além do que está escrito, e o I e o A são importantes pelo quanto de pessoas acredita que estas letras não fazem parte da comunidade.

(Conjuntos de) linguagem pessoal: Uma forma de se comunicar sobre a forma certa de se referir a alguém. Por exemplo, muitas mulheres usam a/ela/a como conjunto de linguagem pessoal.

Usar “linguagem feminina/masculina/neutra” ao invés de explicitar a própria linguagem prejudica pessoas não-binárias e que usam neolinguagem. Usar “elu/delu” ou similar também prejudica pessoas com linguagem mais fora da norma.

O modelo que recomendamos atualmente é artigo/pronome/final de palavra.

Também acho bom lembrar que linguagem não se resume a “pronomes” ou a “artigos“. Ao se referir a um conjunto de linguagem, use conjunto, linguagem ou conjunto de linguagem. Acho sistema ou modelo palavras estranhas para isso, mas ainda fazem mais sentido do que pronomes, neste caso.

Neolinguagem se refere às partes da língua portuguesa coloquial que substituem termos ligados aos gêneros gramaticais binários da língua culta. Por exemplo, linde ou lindae ao invés de linda ou lindo, ila ou elu ao invés de ela ou ele, e por assim vai. É possível dizer que o neoartigo le ou que o neopronome elx são elementos de conjuntos de linguagem.

Neolinguagem não se resume a termos feitos para serem neutros ou genéricos (portanto linguagem neutra é um termo inadequado para cobrir toda a neolinguagem), e também não se resume a termos que são possíveis de falar ou escrever. Usar um emoji como pronome também consta como neolinguagem, por exemplo. Mais sobre neolinguagem aqui.

Orientações não se limitam a orientações sexuais e românticas, e, quando são baseadas em gênero (atração por homens/por mulheres/etc.), não são baseadas na corporalidade (“sexo”) ou nas orientações alheias, e sim na identidade de gênero (ou, no máximo, em coisas como alinhamento de gênero e expressão de gênero, no caso de pessoas onde isso afeta fortemente sua experiência de gênero).

Além disso, não recomendo usar termos como “orientações alo” ou “orientações mono“.

Pessoas podem ser individualmente alo ou mono, mas orientações como lésbica ou poli não fazem uma pessoa que também é, por exemplo, demi ou arromântica, deixar de ser a-espectral. E pessoas que são, por exemplo, abrorromânticas feminassexuais ou heterorromânticas pansexuais não se beneficiam do monossexismo só por sua atração ser restrita a um gênero em uma de suas orientações.

Enquanto isso, alguém que é dêmi e lésbica vai sempre ser a-espectral, e alguém que é feminassexual e abrorromântique vai ter sempre uma orientação fluída. Essas coisas nunca vão ser contempladas pelo monossexismo.

Pessoas periorientadas são as que não precisam de mais de um tipo de orientação para definir sua atração. São as pessoas que só se identificam como gays, gris, assexuais e arromânticas, trixenromânticas, pomo-orientadas, pôli e pan, assexuais viramóricas ou nanobissexuais.

Dá pra ver que isso não significa que só usam uma palavra, ou que só usam sua orientação sexual. Só significa que não dividem sua orientação em mais de uma categoria, ou que, mesmo dividindo, a divisão não é muito útil, pois tais orientações são iguais.

Enquanto isso, pessoas variorientadas são as que precisam de mais de uma categoria. São pessoas que se identificam como cupiorromânticas polissexuais, biqueerplatônicas bissexuais arofluxo, virromânticas akoissexuais, grisromânticas mirsexuais, omnialternativas proculromânticas, etc.

Sapiossexual é sim uma identidade capacitista (leia o item 5 deste texto para entender melhor o motivo) e que portanto não deveria ser utilizada. Porém, não só pessoas passam tanto tempo criticando esta identidade que ela tem bem mais visibilidade do que outras identidades mais úteis, como também suas críticas muitas vezes tem cunho alossexista, monossexista e/ou reducionista.

O problema de sapio é a dependência de um conceito capacitista, e não alguém sentir atração por poucas pessoas, não querer categorizar sua atração em questão de gênero ou ousar usar um rótulo além de gay, hétero e bi.

Se você sinceramente se considera sapio, sugiro que dê uma olhada em aliquis, gris, noeti e dêmi.

Não use “terceiro gênero” como identidade de gênero ou nome para marcador de sexo não-binário nos documentos. É uma terminologia colonialista utilizada para apagar o que colonizadóries viam como gêneros separados de homem e de mulher.

Em relação às corporalidades perissexo, evite termos como “sexo masculino“, “sexo feminino“, “macho“, “fêmea” e outros termos com conotação de gênero.

Em geral, você nem vai estar falando especificamente de pessoas perissexo e pode falar de alguma parte do corpo ou função específica (“em corpos onde a testosterona predomina…”, “em relação a pessoas que podem engravidar…”). Mas, supondo que você esteja falando das expectativas associadas a pessoas perissexo, você pode usar “corpos perissexo ovariados” (ou testiculados), ou algum outro tipo de terminologia que não associe identidade de gênero a tais corpos.

Evite usar termos como FtM, MtF, FtX, MtN, etc. caso não sejam para se referir a pessoas que se identificam com eles.

Para se referir a pessoas trans que são mulheres ou homens, homem trans e mulher trans são o suficiente. Se você quiser falar de experiências mais gerais, talvez “experiências de pessoas trans designadas como [gênero] ao nascimento”, “experiências transmasculinas”, “experiências transneutras”, etc. sejam termos mais adequados; mas vai depender muito de cada situação.

Para bastante gente, a maioria das identidades NHINCQ+ são adjetivos, e não substantivos. Ou seja, seria “uma pessoa abrossexual”, “elu é agênero” ou “um homem trans” ao invés de “ume abrossexual”, “elu é ume agênero” ou “um trans homem”. Pode ser difícil saber quais palavras são adjetivos e quais são substantivos, mas, na dúvida, acho melhor errar por usar “pessoa femil” do que por usar “ume não-binárie”.

É sempre bom não presumir quais grupos passam ou não por certas coisas, ao invés de só perguntar pelas especificidades, caso você esteja procurando experiências específicas.

Por exemplo, se você quer saber informações sobre binders, pode ser bom abrir o assunto perguntando por pessoas que usam binders, e não por pessoas transmasculinas; afinal, nem toda pessoa que usa binder é transmasculina, e nem toda pessoa transmasculina usa ou usou binders.

Se você quer saber sobre efeitos do estrogênio na terapia hormonal, você deve perguntar sobre quem tomou estrogênio por conta de terapia hormonal, e não sobre mulheres trans binárias; mulheres trans não deixam de ser binárias por não tomarem estrogênio, e pessoas não-binárias podem tomar estrogênio sem se identificarem como mulheres ou mesmo como pessoas transfemininas.

Aquele desenho do biscoito é ruim e muitas vezes ofensivo.

Mais recursos básicos


Eu entendo que, em algumas ocasiões, pode fazer sentido usar terminologia problemática para que alguém entenda uma questão importante, ou para pesquisar informações.

Porém, isso não significa que tal terminologia precise ser incentivada. Ela afasta pessoas mais frágeis de certas comunidades, dá a ideia de que quem a usa não acredita na existência ou importância de certos grupos e ensina a todas as pessoas ao redor que essas coisas são aceitáveis.

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